Pense em um carro moderno, potente, com todos os acessórios de fábrica e alta tecnologia para que ele possa ter um desempenho espetacular nas estradas, proporcionando conforto e rapidez nos deslocamentos. Mas se esse carro não estiver com pneus em bom estado, ele não vai ter a performance esperada.
Podemos fazer esse comparativo com os cascos de um cavalo. “O cavalo com o casco em mal estado e ferrado inadequadamente é como um carro com os pneus carecas, desalinhados e desbalanceados. O cavalo depende da boa saúde dos cascos para ter melhor desempenho, ”afirma o técnico em Ferrageamento, Vinícius Falante, que lembra uma frase conhecida em todo o mundo “no hoof, no horse, ou seja, sem casco, sem cavalo.”
Vinícius destaca que o cavalo possui o aparelho locomotor mais perfeito entre os seres vivos e que “não tem mãos nem pés, ou seja, o cavalo caminha sobre os dedos.” Por isso, a prioridade do ferrador é manter a melhor saúde e a melhor manutenção desse casco para que o cavalo mantenha sempre alinhado e balanceado o eixo podofalangico, que é a estrutura de locomoção dos cavalos.
Mas qual seria então, o ferrageamento ideal para o cavalo de marcha? Essa é uma questão complexa, na opinião de Vinícius Fallante, já que o cavalo marchador não compete contra o relógio e há uma série de fatores que são levados em consideração no julgamento, como rendimento, estilo, comodidade, gesto de marcha, entre outros. O mais importante, segundo ele, é que o cavalo seja ferrado corretamente. “Ferradura não faz cavalo marchar, quem faz cavalo marchar é barriga de égua. A ferradura serve para lapidar a marcha que já existe nesse cavalo.”
“Ferradura não faz cavalo marchar. Quem faz cavalo marchar é barriga de égua.”
Assim como os pneus nos carros, as ferraduras também se desgastam e precisam ser trocadas periodicamente, para garantir conforto e bem-estar ao cavalo. Segundo Vinícius, é preciso trocar as ferraduras a cada quatro semanas estando elas novas ou não. “E considerando-se que o cavalo leva de três a seis dias, em média para se adaptar, o ideal é trocar as ferraduras, pelo menos, três dias antes de uma competição,” aconselha.
Os perigos do ferrageamento incorreto
Vinícius Fallante salienta que, assim como a ferradura pode trazer benefícios para o cavalo, também pode fazer muito mal, isso porque o casco está o tempo inteiro crescendo e mudando de forma. Assim, se o ferrageamento for feito de forma incorreta vai provocar lesões, algumas graves. Antigamente ferrava-se o animal apenas para a proteção dos cascos. Hoje com o desenvolvimento dos estudos e técnicas, o ferrageamento além de proteger serve para melhorar a performance e até mesmo para tratamento de algumas doenças. “Me preocupa muito nas competições de marcha dentro da nossa raça, os artifícios feitos no casco do cavalo abandonando-se aquela meta de deixar o eixo podofalangico alinhado.”
“Me preocupa muito os artifícios feitos nos cascos dos cavalos.”
O técnico em ferrageamento ressalta que estes artifícios usados diretamente no casco do cavalo são feitos a partir de proibição de determinados tipos de ferradura. “Um cavalo que tem pouco gesto de marcha, pode ser colocada uma ferradura ortopédica para corrigir o gesto de marcha. Como não pode ser usada ferradura para melhorar o gesto de marcha, se faz o artifício no casco, desbalanceando assim o cavalo, exemplo disto, os cascos mais ``achinelado´´que tem como consequências as lesões no tecido mole do animal.”
Além do correto ferrageamento, é fundamental, na visão de Vinícius, a manutenção é fundamental. O casco precisa estar sempre higienizado e hidratado com material orgânico “ou com sebo de carneiro, cera de abelha lanolina e nunca materiais químicos,” enfatiza.
Importância do profissionalismo
Apaixonado pela raça desde criança, Vinícius é formado na escola de equitação do exército brasileiro e fez estágio com o professor Mitch Taylor, da Kentucky Horseshoeing School. Ele recorda, no entanto, que quando iniciou sua formação não havia cursos voltados para o Mangalarga Marchador e por isso teve de adaptar todo o conhecimento adquirido em relação ao cavalo de trote para o cavalo de marcha.
Com vasta experiência na raça, ele alerta que o foco dos criadores e de quem trabalha na raça deve ser sempre a saúde do animal, buscando conhecimentos em podologia. “Quando o cavalo está com a saúde boa dos cascos, a melhor performance vem como consequência.”
A integração entre ferrador e cavaleiro é de extrema importância para um grande desempenho do cavalo marchador. “Quem sabe dos defeitos do carro é o piloto, assim como quem sabe o que o cavalo tá precisando é o peão que tá em cima,” compara. Dessa forma, o peão precisa repassar todas as informações para que o ferrageamento atenda às necessidades do cavalo e do cavaleiro.
Vinícius Fallante faz questão de frisar que apesar de trabalharem em sintonia, é preciso que cada um reconheça o seu papel. “Peão é peão, ferrador é ferrador. Peão não tira embrião porque não é veterinário de reprodução, não faz raio-x porque não é veterinário de ortopedia, então, peão não pode ser ferrador. Peão é um profissional, ferrador é outro, mas trabalhando sempre em sintonia para o bem-estar do animal.”
“Peão e ferrador têm que trabalhar em sintonia. Mas peão é peão e ferrador é ferrador.”