No treinamento de marchadores de alta performance, é de extrema importância desenvolver suas habilidades, melhorando progressivamente a sua qualidade de movimentação, resistência, equitabilidade, comodidade e integridade física, até tentarmos atingir seu potencial máximo. Sabemos, hoje em dia, qual seria o treinamento ideal, respeitando as limitações e a individualidade de cada animal, mas, no entanto, na maioria dos casos, não conseguimos colocá-lo em prática por vários motivos:
1º) Falta de conhecimento técnico por parte das pessoas envolvidas direta e indiretamente no treinamento em suas diversas fazes: criação, avaliação, equitação, metodologia de treinamento, alimentação, suplementação, casqueamento, ferrageamento, preparação física, manejo, cuidados com o marchador atleta e apresentação nas competições eqüestres.
2º) Calendário anual de competições eqüestres inadequado e incompatível com a integridade física dos animais.
3º) Exigências nos julgamentos não compatíveis com a idade dos animais.
4º) Início do treinamento muito cedo e com alta exigência física em animais muito jovens, ainda em fase de crescimento.
Para começar os cuidados com o marchador atleta já deveria começar na fase intra-uterina, com uma boa alimentação e mineralização da receptora ou matriz, continuando também após o nascimento até sua apartação com 5 a 7 meses, dependendo do manejo, da alimentação e do desenvolvimento de cada indivíduo. Importante salientar que neste período e até antes, teríamos que realizar os primeiros casqueamentos. Quanto mais cedo, mais fácil de corrigir defeitos de aprumos e se não existirem, conferir e balancear os cascos para evitar danos maiores no futuro.
Após apartação, é muito comum deixarem os potros sem a companhia de animais mais velhos e experientes, começando então os acidentes... Pior ainda aqueles que criam seu melhor potro sozinho, atrapalhando sua socialização e estimulando o aparecimento de distúrbios comportamentais muitas vezes irreversíveis no futuro. Nesta fase deveríamos começar também o Cabresteamento simples ou para competição, respeitando todas as fazes, passo a passo, salientando que esta modalidade não prejudica os animais mais novos, deste que seja efetuada TREINAMENTO IDEAL PARA CAVALOS MARCHADORES (ainda muito longe da nossa realidade). Os problemas de potros cabresteados tem origem na limitação técnica do cabresteador, no excesso de confinamento em baias, na preparação física mal feita e no transporte.
O início da doma de baixo (trabalho na guia e ou charreteamento) começaria aos 3 anos e a doma de cima a partir dos 3,5 anos com trabalhos de baixa intensidade, ênfase nos ensinamentos dos comandos e exercícios básicos de adestramento. Muito passo, 10 a 12 minutos de marcha, 6 a 8 minutos de galope. Intervalos de 2 dias entre montadas para a boa recuperação dos animais. Após 30 dias de trabalho leve, o ideal seria deixar o animal em repouso total por mais 30 dias, em regime aberto, a fim de eliminar as dores acumuladas no primeiro mês de montaria. Oque metaforicamente chamamos de “Dr. Campos.”
O adestramento básico terminaria aos 4,5 anos de idade, nunca ultrapassando 16 minutos de marcha e 8 minutos de galope.
Não poderíamos utilizar os machos na padreação de éguas neste período, para não atrapalhar a concentração do animal no aprendizado dos exercícios de adestramento básico.
Os animais deveriam ser locados em piquetes de no mínimo 40 x 40 metros, com baias abertas ou mantê-los soltos por no mínimo 6 horas por dia.
Os animais começariam a competir a partir dos 4,5 anos de idade em provas de adestramento básico em substituição aos atuais concursos de marcha, com no máximo 16 minutos de duração. Nesta prova teríamos a avaliação de todos os exercícios de adestramento básico obrigatórios, dentre eles estariam incluídos os nove andamentos: passo reunido, médio e alongado, marcha reunida média e alongada, galope reunido, médio e alongado. A marcha poderia ter o peso dobrado. Seria mantido o julgamento de morfologia tradicional.
A partir dos 5 anos, os animais seriam iniciados nos treinamentos para concurso de marcha, seguindo planilhas específicas contendo os tempos de marcha, galope e trabalhos complementares (passo, hidroginástica ou natação). Seriam pelo menos seis planilhas, divididas em categorias segundo a idade e o nível de fragilidade de cada indivíduo:
• cavalos jovens frágeis, médios e fortes.
• cavalos adultos frágeis, médios e fortes.
Os animais trabalhariam seis dias na semana e descansariam no domingo. Três dias montados em dias alternados e três dias de trabalhos complementares que poderiam ser o passo, natação e hidroginástica, com lâmina de água alta ou baixa, de acordo com as características e individualidade de cada animal. Os exercícios complementares, como seu próprio nome indica, complementam o trabalho de montaria, diminuindo a intensidade do trabalho de alto impacto, como a marcha e o galope, além de aliviar as dores acumuladas na região dorso – lombar, ocasionadas pelo peso do cavaleiro. O intervalo entre as montadas poderia ser alterado para 2 dias no caso de animais mais sensíveis ou com pouco poder de recuperação.
Quanto à prova funcional atual, ela teria que ser modificada. Para animais de até 5 anos, não teríamos a troca de pé direta ao galope nos tambores, sendo permitida uma troca de pé simples ou indireta e o obstáculo de salto poderia ser um X; o mais indicado para cavalos iniciantes. Para os animais acima de 5 anos, poderíamos continuar com a prova atual ajustando apenas as distâncias entre os obstáculos que estão erradas. Teríamos que tirar a prova funcional de dentro das provas de marcha pelo menos na Exposição Nacional que é a referência, com piso próprio para este tipo de competição e com árbitros capacitados e reciclados. Logicamente esta prova teria que ser mais didática e para tal, teria que ser comentada, pois no modelo atual nenhum cavaleiro sabe onde e porque está errando.
Quanto ao tempo das provas de marcha, teríamos que ter um tempo menor apenas nas categorias de animais jovens. Os adultos treinados segundo o modelo acima, não teriam maiores problemas com o tempo atual das provas porque teriam tempo suficiente para o condicionamento ósseo, tendíneo e articular. Além disto, neste modelo de treinamento descrito acima, diminuiríamos sensivelmente os riscos de lesões e degastes articulares na fase mais crítica, correspondente ao período de crescimento e fechamento das placas epifisárias.
Em relação ao calendário das competições, o criador deveria mudar sua mentalidade radicalmente. O ideal seria treinar e competir durante 8 meses, no máximo, deixando 2 meses para descanso completo (férias) e mais 2 meses para o reinicio gradativo das atividades equestres anuais, pós – férias.
Vejamos que o modelo acima é muito difícil de ser empregado, na sua íntegra, pelos motivos citados acima. No entanto, ele serve de alerta para aos problemas e anomalias que acometem os marchadores na atualidade. Nos últimos três anos, consigo perceber claramente a nobre intensão da diretoria da ABCCMM em corrigir os rumos do mal treinamento e apresentação dos marchadores, diminuído as famosas “Gambiarras equestres” e as consequências desastrosas da “cultura da frequência”, presentes no dia a dia do marchador de competição. Cavalos tensos, espremidos entre as pernas e as mãos dos nossos cavaleiros e o aparecimento de sintomas indesejáveis que podem ser facilmente identificados: falta de descontração do maxilar, rigidez na coluna vertebral, inversão da coluna e do conjunto de frente, piora na elasticidade dos movimentos, retro- pegada, prejuízo em todo o sistema de amortecimento corpóreo, comodidade comprometida, deturpação do verdadeiro diagrama de marcha, dificuldade na condução dos animais e perca da integridade física. É muito problema e acho que posso ter me esquecido de mais alguns...
No momento atual, vejo toda a área técnica da ABCCMM, inclusive os árbitros preocupados e dispostos a premiar animais mais descontraídos física e mentalmente, mais flexíveis, com atitude adequada à função principal de marchar com legitimidade. Vejo hoje animais mais cadenciados, quesito principal para se avaliar a qualidade do andamento. Árbitros analisando corretamente a qualidade de movimento e valorizando um cavalo bem equitado. Sou muito otimista, estamos em um momento muito especial e temos que aproveitar o embalo: O Verdadeiro Cavalo Marchador agradece!!!