O REGRESSO DA MARCHA PICADA | REVISTA RAÇA MARCHADOR

O REGRESSO DA MARCHA PICADA

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O REGRESSO DA MARCHA PICADA

O REGRESSO DA MARCHA PICADA

Por: Markus Thulio A. Guimarães

“A raça passou por várias influências de modismos, mas o bom senso sempre prevaleceu e o padrão sempre prevalecerá”. Márcio de Andrade

Entre os anos de 1930 e 1940, um dos motivos, entre vários outros, que fizeram com que determinada parcela do seleto grupo de fazendeiros mineiros não aceitasse uma eventual união com os criadores paulistas, para que agregassem à associação recém-criada por estes, foi o fato de que haviam abolido do seu regulamento, já na fundação da entidade, a marcha picada.

Em Minas Gerais, já havia rebanhos que notoriamente produziam e preservavam animais desse andamento, em especial aqueles situados próximos a região de Belo Horizonte, como os criatórios Passa Tempo, Gas e do Barreirinho, de Bolivar e Márcio de Andrade, Gastão Resende e Antônio Pitangui, respectivamente.

Considerando que esses foram sócios fundadores da ABCCMM e aguerridos entusiastas da raça após a inauguração da entidade, além de influentes criadores, acredita-se que eles tenham exercido papel primordial na defesa da tese de que uma nova associação deveria ser formada, a qual abrangesse o campo da marcha de forma ampla e prudente, excluindo o trote e a marcha trotada, resguardando a preservação das marchas batida e picada.

Do ponto de vista histórico, entretanto, é importante destacar que a grande maioria dos criadores que mais tarde fundariam a Associação do Mangalarga Marchador selecionava cavalos de marcha batida, em especial aqueles estabelecidos no sul do estado de Minas Gerais.

Porém, em detrimento do elevado grau de dissociação que os mesmos conferiram às suas seleções, sempre foi corriqueiro o nascimento de potros detentores de marcha picada, como ocorre ainda hoje. Logo, querendo ou não, esse andamento estava presente com constância.

Fundada a associação, em julho de 1949, considerando a importância de preservar a marcha, seja ela qual fosse, ficou estabelecido já no primeiro Padrão Racial do Mangalarga Marchador, aprovado em Assembleia Geral Extraordinária, que seriam admitidos os seguintes andamentos: “Marcha avante, batida ou picada, tanto quanto possível regular”.

Nesse sentido, analisando o esplendoroso contexto de criação da ABCCMM, imbuídos pelo brilho de um lampejo, os seus fundadores valorizaram a diversidade da raça sem deixar de lado e identidade do cavalo mineiro. De antemão se torna explícita a importância histórica que a marcha picada possui para o Mangalarga Marchador.

Com o passar de algumas décadas, entretanto, novas linhas de pensamento afloraram na raça e aquele andamento, aos poucos, passou a ser marginalizado, embora fosse selecionado por alguns criadores e continuasse a nascer, mesmo que de maneira espontânea, na grande maioria dos criatórios nacionais.

Já nos últimos anos do século passado, a marcha picada encontrava-se vivendo os seus piores momentos. A maioria daqueles criadores que bravamente defenderam a sua permanência, ainda na fundação da associação, e preservação, ao longo dos anos, já não era mais tão atuante.

Incrivelmente, no momento em que o Mangalarga Marchador direcionava os seus holofotes para a valorização da marcha, a marcha picada, máxima expressão de dissociação, além de não mais encontrar espaço nas competições e há muito ser excluída das principais pautas da raça, injustamente começava a ser alvo de repressão.

O inconveniente preconceito e as inúmeras críticas se intensificaram, culminando, no ano de 1996, com a alteração do Padrão Racial e retirada definitiva do texto que a legitimava como autêntica característica do Mangalarga Marchador. Consequentemente, os produtos que nasceram detentores daquele andamento, a partir de então, passaram a enfrentar grande dificuldade em ter os seus registros genealógicos aceitos, por ordem conferida aos técnicos de registro, mesmo que contra o desejo de muitos.

Dito de outro modo, para existir na raça, a partir de então, somente através da clandestinidade.

O grupo de criadores que selecionava a marcha picada foi pego de surpresa. Reduzidos em número e sem força política, ainda que muito respeitados, não encabeçaram uma reação imediata.

A fim de registrarem os seus produtos, os criadores passaram a buscar opções alternativas. Durante a avaliação técnica para admissão do registro definitivo, ao montar nos animais, os peões não exerciam pressão alguma sobre eles, com vistas a evitar ao máximo que “picassem” e tivessem os seus registros negados. Foi assim, por exemplo, que o Sr. Gabriel Donato de Andrade, titular do rebanho Calciolândia, notável selecionador de animais de marcha picada, encontrou um meio que garantisse o registro dos seus cavalos.

Entretanto, isso não era o bastante. Sem o apoio e devido reconhecimento da associação, tornava-se difícil levar adiante uma seleção de animais que apresentasse como andamento característico algo que não fosse atestado pelo Padrão Racial. Muitos animais deixaram de ser registrados e a marcha picada começou a encarar uma forte onda de desvalorização na raça.

Com os seus animais relegados à acepção de cavalos comuns, os usuários que procuravam exemplares macios e registrados, outrora encontrados no Mangalarga Marchador, passaram a buscá-los em outras associações. Assim, desestimulados, muitos criatórios tornaram-se defasados.

Pio Guerra Júnior, proprietário da Coudelaria Cavalgada, em Gravatá/PE, conta que, quando iniciou a sua criação, no ano de 1998, enfrentou imensa dificuldade para encontrar animais de marcha picada na raça.

“Quando eu comecei a criar os meus cavalos, não conhecia na raça um criatório exclusivo de marcha picada sequer. Não havia alguém que se dedicasse à seleção desse andamento dentro da raça. Ela [marcha picada] não era julgada em exposição, não existia no Padrão Racial e não tinha o seu registro aceito. Como poderia alguém querer criar isso? Seria para se tornar criador de animal em extinção? Para as pessoas de maneira geral, nós éramos usuários. Entretanto, mesmo assim, em pouco tempo, eu tracei em mente as linhagens que eu deveria seguir para formar a minha tropa inicial. Porém, sem seguir roteiro, acabei visitando o Brasil inteiro em busca de animais, pois eu estava disposto a ir a qualquer lugar em que eu ouvia dizer que havia um bom exemplar de marcha picada.”Em menos de cinco anos, com os criadores impotentes em sanarem a procura dos clientes que almejavam obter animais de marcha picada, a ABCCMM passou a ser alvo de críticas. Nesse instante, ela começava a assumir a responsabilidade de uma atitude instaurada por seus diligentes. A partir de então, a marcha picada passava a tornar evidente a sua importância comercial.”, disse Pio Guerra 1

Diante de uma situação de indiferença e desvalorização insustentável, os selecionadores iniciaram as conversações para voltarem com a marcha picada, de maneira oficial, para a raça. A tarefa exigiria um esforço hercúleo, mas seria de crucial importância assegurar alguns interesses do cavalo e dos criadores, tais como: atender adequadamente à reserva de mercado crescente, voltar a registrar e passar a julgar os exemplares de marcha picada em eventos oficiais promovidos pela ABCCMM.

1 Depoimento prestado ao autor durante a construção desta obra.

Maurício Cabalzar, criador na região metropolitana de Belo Horizonte/MG e titular do Haras Marina, encabeçou um movimento de criadores que estavam dispostos a batalhar pelo retorno da marcha picada para o Padrão Racial do Mangalarga Marchador. O intuito principal do grupo era obter apoio de criadores influentes, elaborar um documento e transmitir à associação o anseio daqueles que estavam preocupados com o rumo que a raça estava tomando.

Minuciosamente, o grupo colheu cerca de duas centenas de assinaturas, depois de procurar criador por criador e apresentar o esboço da proposta. Através da figura de Nelson Boechat, presidente da associação que apoiou inteiramente a decisão daqueles criadores, eles apresentaram a audaciosa, porém essencial, aspiração à ABCCMM, que colocou em pauta o projeto.

Dalton Colares de A. Moreira, veterinário e integrante do quadro de árbitros da associação por 15 anos, já defendia naquele período que a marcha picada era inerente à raça e sempre estivera presente nos mais diversos criatórios. Insatisfeito com a situação em que se encontrava o Mangalarga Marchador no contexto daquela época, ele iniciou um diálogo com Nelson sem a presença de intermediários. Entre as conversações estabelecidas, Dalton relembra de um trecho que considera ter sido decisivo:

“Em visita a Belo Horizonte, eu resolvi me dirigir ao célebre Parque da Gameleira, para matar a saudade daquele lugar. Lá chegando, talvez inspirado pela energia do local, eu decidi que deveria ligar para o Nelson e expor algumas das minhas indignações. Prontamente ele atendeu. Dispensados os cumprimentos, eu então lhe disse:

- Nelson, o andamento da nossa tropa de marcha batida está predominantemente diagonal. Eu acompanho este cenário há 20 anos e não tenho visto mudanças significativas. Existem bons animais, mas eles não são a regra. Desse modo, pode ser que no futuro nós voltemos a usar o cavalo de marcha picada para resgatar o andamento nos nossos animais de marcha batida.

Todavia, o banco genético da marcha picada, e da marcha genuína por consequência, está sendo perdido. Há anos nós não registramos mais animais com esse andamento. É preciso preservar isso. Uma providência tem que ser tomada!

“Dalton, escreva uma carta para mim, fazendo uso dessa justificativa, que eu encaminharei para o Conselho Técnico. O momento, inclusive, é muito oportuno, já que nós reuniremos agora para conversar sobre isso”, Nelson respondeu.

“Naquela reunião a minha carta foi apresentada e, somada ao anseio de uma maioria presente, quase que por unanimidade, o Conselho aprovou a medida. Nesse dia, nós vimos ser dado o primeiro passo para que a marcha picada voltasse oficialmente para a raça.”, acrescenta Dalton.2

2 Depoimento prestado ao autor durante a construção desta obra.

 

Montes Claros, 09 de setembro de 2002.

Ao presidente da ABCCMM
Exmo. Sr. Dr. Nelson Boechat Cunha

Tenho observado que o Mangalarga Marchador tem evoluído muito na sua dinâmica do andamento, e que muito disto se deve a seleção da marcha predominantemente diagonalizada.

A marcha que hoje é procurada pelos criadores e juízes, no meu entender, é um andamento de muita qualidade onde encontramos equilíbrio, avanço e bom cômodo nos animais superiores.

Porém, vejo que, inevitavelmente, procurando estas características estamos suprimindo o tríplice apoio, uma vez que os animais selecionados não o têm apresentado com a frequência esperada.

O tríplice apoio por si só caracteriza e distingue a marcha do nosso cavalo.

Os animais que apresentam comodidade em andamento diagonalizado, o fazem por um maior flexionamento das articulações dos membros, ao invés dos apoios tripedais, como era a proposta inicial da raça.

 Visto que, o andamento predominantemente diagonalizado está amplamente aprovado por todos, e por isto quase impossível a reversão desta modalidade de marcha, torna-se imprescindível que algo seja feito para que o banco genético da característica do tríplice apoio, seja preservado e igualmente selecionado. Permitindo que esta característica se manifeste juntamente com as qualidades de equilíbrio, docilidade e beleza racial do Mangalarga Marchador.

Vemos que, a seleção só se acelera quando há procura objetiva pelos criadores em alcançar determinadas características, geralmente indicadas pelos resultados dos julgamentos.

Sendo assim, acredito que, se criarmos o julgamento do cavalo de Marcha Picada, estaremos imprimindo uma seleção dirigida com preservação dos animais que armazenam em si a genética do tríplice apoio.

Acredito ainda que, este animal de marcha picada poderá ser usado no futuro em cruzamento com ode marcha diagonalizada com benefício mútuo, objetivando o cômodo que é a característica maior desta raça. Peço que leve estas minhas observações ao Conselho Técnico como manifesto a favor de preservar o objetivo primário desta raça.

Conforme diz o texto do 1º Padrão Racial aprovado em Assembleia Geral Extraordinária, realizada em outubro de 1950 e modificada em Assembleia Geral Ordinária de 20 de setembro de 1951:

“Andamento – Marcha avante, batida ou picada, tanto quanto possível regular.

Certo de que, os criadores e técnicos responsáveis pelo direcionamento da raça estão imbuídos no sentido de intensificar a seleção da característica “Comodidade”, é que peço a regulamentação do julgamento da marcha picada.

Para tanto, conto com a sua atenção.

Sem mais, agradeço.

Atenciosamente,
Dalton Colares de Araújo Moreira.

 

Com o parecer do Conselho Técnico favorável à readmissão do andamento, todo o processo foi enviado para a aprovação no Ministério da Agricultura, em Brasília/DF, órgão que detém a última palavra. No planalto central, entrou em cena Pio Guerra Júnior.

Como ninguém de Belo Horizonte dirigiu-se à capital brasileira para representar a associação e conferir celeridade ao processo, Pio Guerra Júnior, gozando do seu conhecimento técnico e prestígio, sendo o então diretor e ex-presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil, passou a defender os interesses da ABCCMM, mesmo não delegado oficialmente para assumir tal papel. Junto ao Ministério, ele acompanhava de perto o andamento da ação e intermediava as conversações estabelecidas entre a ABCCMM, associados e o órgão federal.

Posteriormente, em virtude dos seus méritos, Nelson Boechat indicou que Pio coordenasse oficialmente aquele trabalho.

Como se tratava da alteração do padrão racial de uma raça de cavalos, a ABCCMM não estava encarando um procedimento simples. Entretanto, diante da dinâmica atuação de Pio, em poucos meses, todo o projeto foi aprovado pelo ministério, o qual pontuou algumas exigências, como a garantia de que não haveria divergência durante a abordagem do julgamento dos dois andamentos, sendo ambos avaliados da mesma maneira.

Isso foi o suficiente para que imediatamente se iniciasse na raça uma crescente busca e valorização de indivíduos que, em virtude da considerável dissociação que apresentavam, produziam naturalmente descendentes de marcha picada.

Após sucessivos erros e acertos, tornou-se evidente a significativa habilidade que alguns cavalos apresentavam para produzir exímios animais de marcha picada, sobressaindo, a partir de então, reprodutores como Haity Caxambuense (Quartel JB x Sota JB), Lampeão HO (Gaturamo HO x Galiléia HO) e Favacho Único (Herdade Teatro x Havana do Favacho). Ademais, outros animais, referências na produção de exemplares de marcha batida, tornaram-se expoentes também na marcha picada, como foi o caso de Charlatão JG (Sincero JB x Laranjada JB), Cabuçu da Selva Morena (Original de Santa Lúcia x Juventude da Selva Morena) e Original de Santa Lúcia (Caxambu JB* x Invejada de Santa Lúcia). Em comum, antes de tudo, todos apresentavam o fato de serem descendentes de seleções que sempre se dedicaram ao aperfeiçoamento da marcha autêntica.

Hoje, a grande maioria dos celeiros de marcha picada baseia-se na utilização e seleção de indivíduos que descendem desses reprodutores, abnegados pilares da raça e que já se apresentam como insignes padreadores, assim como os seus ascendentes.

Paralelamente, alguns celeiros tradicionais tornaram-se referência na produção desse andamento. Foi o caso dos criatórios Herdade, Gironda, Angahy, Catuni, Porteira de Tábua, Passa Tempo e Calciolândia, mas somente os dois últimos selecionavam verdadeiramente animais de marcha picada.

A propósito, é importante dizer ainda que, em função do Mangalarga Marchador ser constituído por indivíduos predominantemente marchadores, independente da linhagem, qualquer animal está sujeito a produzir descendentes de marcha picada de excelente qualidade, em acasalamentos planejados ou não.

Após 16 anos do seu retorno oficial à raça, em plena expansão, a marcha picada vive hoje momentos de glória.

Do ponto de vista comercial, grande parte dos criadores considera que o comércio da marcha picada não enfrenta crises. Em uma época em que muito se questiona sobre a imposição de limites para a produção do número de embriões, dada a elevada quantidade de produtos que nascem por ano na raça, com uma iminente saturação do mercado, as negociações da marcha picada seguem incólumes, apresentando números de negociações cada vez maiores e cifras mais elevadas, desde a venda de embriões de alto nível a cavalos de sela.

Seja em venda direta, efetuada entre o criador e o comprador, geralmente realizada ainda na fazenda, seja em grandes leilões promovidos pelas grandes empresas, os primeiros produtos a serem negociados são os de marcha picada. O público, geralmente composto por usuários dos finais de semana, como é definido, que representa a base da pirâmide comercial e compreende a maior porcentagem da reserva de mercado, é integrado por pessoas que desejam adquirir cavalos para cavalgadas, passeios pela fazenda e até mesmo para enduros, desde que sejam macios e fáceis de serem equitados.

A respeito disso, Dalton Colares ainda acrescenta:

“De lá para cá [reintrodução da marcha picada no Padrão Racial], outro fato tornou-se interessante: os criadores de marcha batida passaram a ter consciência de que, se eles não melhorassem o andamento dos seus animais, eles perderiam mercado. Com o avanço da marcha picada, não seria mais interessante para os demais criadores deixar de preocupar com a comodidade dos cavalos que eles selecionavam. Os consumidores, usuários do cavalo, buscavam não um cavalo de marcha picada propriamente, mas, sim, cavalos macios. Só que na época isso era predominantemente encontrado na marcha picada. Não era popular, assim como ainda é hoje, o fato de que existem cavalos macios de marcha batida. Particularmente, eu considero esses cavalos ótimos de serem montados, mas isso ainda não está amplamente difundido.

Então, entre outros motivos, eu considero a marcha picada importante para a raça também por isso. Sem dúvidas, ela forçou o melhoramento do cavalo de marcha batida.”, conclui.

No âmbito das competições oficiais, o número de animais de marcha picada já suplanta os de marcha batida, em algumas feiras. A título de exemplificação, tem-se a última “Fenagro” (28/11/2018 a 2/12/2018), o maior e mais tradicional evento agropecuário da região norte-nordeste, que contempla uma considerável quantidade de exemplares do rebanho nacional. A exposição, que ocorreu na cidade de Salvador e contou com a presença de expositores dos estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Sergipe e Alagoas, obteve a participação de 212 animais de marcha picada e 117 de marcha batida.

A união que despontou entre os selecionadores daquele andamento hoje é motivo de orgulho. Quem chega ao Parque de Exposições Bolivar de Andrade (a Gameleira) pela manhã, momento em que ocorrem os julgamentos de marcha picada durante a Exposição Nacional, impressiona-se com a animação dos expositores. Logo tão cedo, reunidos na extremidade esquerda da grande arquibancada, eles já estão apostando em quem será o vencedor, com torcida organizada, bandeiras, sorrindo e cantando em demasia, o que confere ao ambiente uma energia singular.

Além de movimentar as principais exposições do país, existe nos bastidores uma grande equipe de profissionais que vive em função da prestação de serviços a selecionadores do andamento em questão. É comum encontrar, em toda a região nordeste, centros de treinamentos e centrais de reprodução equina que dedicam exclusivamente à marcha picada, estimulando toda a indústria do cavalo e agraciando com ofertas de emprego desde veterinários e zootecnistas a apresentadores e tratadores.

É válido relembrar que, quando a marcha picada começou a despontar novamente nas pistas, uma massiva enxurrada de críticas foi destilada sobre ela, com os argumentos apoiados sobre a ideia de que os cavalos, além de “reboladores” (desequilibrados), não eram genuínos de marcha e apresentavam o andamento imposto através de artifícios.

Na verdade, a crítica é inerente e quase que inevitável a tudo aquilo que é novo e desconhecido. A carência de conhecimento técnico e de estudos aprofundados na área fez com que os criadores de marcha picada enfrentassem um enorme desafio. Porém, em um curto espaço de tempo, graças à coragem e ao empenho com que confrontaram a situação, contando com o condicional apoio prestado pela ABCCMM, através do Eduardo Simões, eleito presidente após a gestão do Nelson Boechat e compromissado em prosseguir com o processo de fomento do andamento dentro dos limites da raça, logo eles superaram qualquer desacordo.

Atualmente, do ponto de vista zootécnico, a qualidade apresentada pelos animais detentores da marcha picada atingiu um nível inquestionável. Além de autênticos marchadores, possuidores de andamento natural, avante, de bom rendimento, bem articulado e muito equilibrado, eles são dotados de muita expressão racial e um tipo morfológico que em nada os diferencia daqueles apresentados por exemplares de marcha batida.

Sem sombra de dúvidas, graças aos gloriosos criadores que lutaram pelo seu regresso, pela preservação e pelo melhoramento, a marcha picada superou todos os obstáculos que a ela foram impostos e encontra-se hoje na sua melhor fase. Cobertos de razão, aqueles criadores encaram garbosos e com muito orgulho a obra que edificaram, em meio a tanto sacrifício e esforço: partir do “ponto zero” e conferir aos animais desse andamento a qualidade que eles possuem. Definitivamente, a marcha picada veio para ficar.

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Raça Marchador Edição 9

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